segunda-feira, 28 de março de 2016

Insônia

Todas as noites são de grande enfado. A energia gasta para pegar no sono por si só já valeria uma outra noite de sono. Eu sigo sempre o mesmo ritual. Escovo os dentes, sento na cama pelo lado esquerdo, encaro as paredes do meu quarto esperando que elas lancem algum sinal de empatia pra mim enquanto eu faço o resumo dos acontecimentos do dia. Somente depois de me fartar da apatia das paredes é que eu estico minhas pernas.
Passo horas encarando a escuridão. O zunido nos meus ouvidos é minha mais comum companhia.
Vez ou outra trago alguém pra aquecer o espaço na minha cama que normalmente é frio. Mas estas companhias não me ajudam a recobrar o sono. Aliás raramente o que querem é dormir. E quando dormem eu continuo acordado, tentando me aproveitar ao máximo a proximidade humana que me provém. O cheiro do suor, a textura da pele, o abraço do corpo nu que vai embora ao chegar da manhã. Esse é o mais próximo que consigo chegar de alguém.
Há algum tempo eu perdi o pudor.
Ah, como demora o sono a cair!
A mente vai a lugares obscuros nessas horas. Diferentemente do corpo inerte que fica a fitar o teto, a mente é irrequieta. Seus abalos arredios podem me deixar acordado por dias a fio. E seu último abalo foi particularmente assustador.
Lembrei-me da beleza de uma dama há que há muito me deixou. Seu riso inebriante, o arrepio em sua pele, o olhar penetrante e cheio de carinho. Mas o sorriso, ah, o sorriso...
Percebo que o canto dos pardais já tomou o lugar do zunido dos meus ouvidos. Logo terei de levantar.
O despertar vem pra mim depois deuma noite insone. Tenho de levantar, mesmo contra minha vontade. Não me importo com rituais pra levantar. É bem mais fácil encarar uma rotina diurna do que passar uma noite acordado.
Pra ir trabalhar você põe uma máscara. A máscara do rapaz feliz, bem humorado e cheio de responsabilidades, que se preocupa com um futuro ao se esforçar na faculdade e no trabalho. Na noite não é tão simples. É na solidão do quarto e na escuridão do coração que encaramos a nossa verdadeira face. E essa face nunca foi tão desfigurada e aterradora pra mim.

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